domingo, 7 de dezembro de 2014

Acção Popular

A acção popular está consagrada no Art.52º/3 da Constituição da República Portuguesa e pode ser definida como o meio colocado à disposição dos particulares para que possam reagir juridicamente a situações que se apresentem não como um problema apenas desse indivíduo em particular mas como lesivas dos interesses de um determinado conjunto de indivíduos. Ou seja, manifesta-se como sendo um instrumento que permite a cada cidadão participar na defesa dos interesses da colectividade.

Regulada na Lei n.º 83/95, a acção popular aparece estreitamente relacionada com a tutela dos interesses difusos. Os interesses difusos, definidos pelo Prof. Gomes Canotilho, são “a refracção em cada indivíduo de interesses unitários da comunidade, global e complexivamente considerada”. Assim, na acção popular, podemos afirmar que estamos perante situações em que o indivíduo actua de forma altruísta, uma vez que defende um interesse indivisível de uma determinada colectividade, mas, regra geral, representa essa actuação também um interesse para si mesmo, embora não revista a forma de interesse individual, uma vez que não se trata de um direito subjectivo nem de um interesse específico daquele indivíduo em particular.

Ainda no Art.52º/3 da CRP verificamos que apenas pode existir acção popular “nos casos e termos previstos pela lei”, significa portanto que, para que possa existir o direito à acção popular, tem sempre que haver uma lei que concretize esta possibilidade. No caso do contencioso administrativo essa lei é o Art.9º/2 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos que nos diz que “independentemente de ter interesse pessoal na demanda” existe “legitimidade para propor e intervir” sempre que estejamos perante a defesa de determinados bens. Esses bens, conforme o artigo indica, têm que ser “constitucionalmente protegidos”, seguindo-se uma série de exemplos, nos quais facilmente conseguimos identificar a essência atrás referida: são bens indivisíveis, que pertencem a “todos” os indivíduos em geral sem que nenhum deles possa apropriar-se dos mesmos individualmente, tais como, por exemplo, o ambiente, o património cultural e a qualidade de vidas. Assim, a acção popular vem determinar uma maior abrangência da legitimidade processual que é conferida aos indivíduos pelo número 1 do mesmo artigo, tendo como principal objectivo a protecção dos interesses difusos anteriormente referidos.

Quanto à interpretação do Art. 9º/2, a doutrina diverge no sentido em que parte da mesma considera que apenas pode recorrer à acção popular quem não tenha interesse pessoal na demanda, caso contrário não o poderá fazer, pois, em princípio, terá outros meios à sua disposição para o fazer, que não a acção popular. Concordo com a parte da doutrina que defende o contrário, isto é, basta que estejam em causa interesses difusos para que qualquer particular, tenha ou não interesse pessoal na demanda, possa dar uso à acção popular, pois é isso que está explícito na primeira palavra do artigo em questão. “Independentemente” significa, a meu ver, “sem prejuízo de ter ou não interesse pessoal na demanda”, qualquer pessoa ou entidade referida de seguida, tem legitimidade para propor acção popular, desde que estejam em causa os bens constitucionalmente protegidos aí definidos ou deles semelhantes.

Dentro da acção popular, o Prof. Paulo Otero considera existirem várias modalidades da mesma, dependendo do objecto da acção, estando as três primeiras modalidades consagradas no Art.52º/3/a):


  • Acção Popular Preventiva – Destinada a prevenir eventuais infracções contra os interesses da colectividade ou violações dos mesmos;



  • Acção Popular Destrutiva ou Anulatória – O seu objectivo é cessar infracções ou violações que já estejam a decorrer contra esses mesmos bens;


  •  Acção Popular Repressiva – Promove a perseguição judicial dos infractores dos referidos bens;

  • Acção Popular Indemnizatória – A finalidade da mesma é obter o ressarcimento pelos danos provocados à colectividade, resultantes da infracção;

  • Acção Popular Supletiva ou Substitutiva – Tem como objectivo defender os bens que integrem o património a entidades públicas, estando a mesma consagrada no Art. 52º/3/b).


Há ainda que referir que existe também uma distinção relativa à legitimidade de propositura da acção popular. Podemos então classificar como: acção popular individual, a que é proposta por cidadãos particulares, no exercício dos seus direitos; acção popular colectiva, a que é intentada por associações ou fundações; acção popular pública originária, a intentada por autarquias locais e, por fim, acção popular pública superveniente, a protagonizada pelo Ministério público que, além da ter iniciativa processual, tem também legitimidade substitutiva, isto é, pode representar particulares ou outras entidades em caso de desistência destas.

Para concluir, há que relembrar que a figura da acção popular é relativamente recente no contencioso administrativo, tendo sido admitida e aprofundada apenas aquando da reforma do mesmo, no entanto podemos considerar que tem assumido um papel cada vez mais relevante, principalmente em temas relacionados com o Ambiente.



Telma Silva
Nº18431

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