domingo, 7 de dezembro de 2014

O conceito de ato administrativo enquanto critério de distinção entre as ações de prestação e as ações de condenação à prática do ato devido

1.         Segundo o princípio da decisão, previsto no artigo 9.º n.º 1 do CPA, e do artigo 286.º n.º4 da CRP que consagra o princípio da tutela efetiva dos direitos dos particulares, os órgãos da Administração têm o dever de se pronunciar sobre todos os assuntos da sua competência e que lhe sejam apresentados por particulares em defesa dos seus direitos subjetivos.
A Administração pode responder deferindo o requerimento, sendo esta decisão um ato de conteúdo positivo. O que muitas vezes ocorre é a situação de incumprimento do dever de decidir, do qual resulta, tal como o artigo 66.º n.º 1 do CPTA indica, a ilegal omissão ou recusa de um ato administrativo, ou seja, atos de conteúdo negativo.

2.         A distinção entre atos de conteúdo positivo e atos de conteúdo negativo passa por saber se a decisão (ato) em causa altera, de alguma forma, o statu quo da situação, ou seja, se houve impacto sobre o estado da situação, modificando a realidade, ou não. Um ato de conteúdo positivo como um deferimento altera a situação pois, por exemplo, se um particular pediu uma licença de construção, e ela lhe foi concedida, o particular vai passar de uma situação em que não pode construir, para um situação em que isso já é uma possibilidade. Por outro lado, perante um ato negativo como uma omissão administrativa, a situação do particular mantém-se igual. Caso mais peculiar é o do indeferimento. Aí estamos perante uma decisão, mas não se pode impugnar porque a situação do particular permanece tal como estava (usando o exemplo acima dado, o interessado continua sem poder construir). O indeferimento, apesar de ser uma ação, deve ser entendido como um ato de conteúdo negativo, na medida em que constitui um não deferimento da pretensão do interessado, e, portanto, essa pretensão não foi atendida. Portanto apesar de operar efeitos de consolidação jurídica, recusa  a produção dos efeitos jurídicos pretendidos. Assim, perante uma situação de indeferimento expresso, deve propor-se uma ação de condenação à prática do ato devido (pretensão do interessado) e através desta ação será necessariamente eliminado aquele indeferimento.
É por isto que perante um ato de indeferimento expresso se deve propor ação de condenação ao ato devido, visto que o ato de indeferimento será, por esta via, erradicado assim que a pretensão do interessado seja atendida.

3.         O artigo 67.º n.º 1 do CPTA elenca os pressupostos necessários para que se possa propor uma ação administrativa especial de condenação à prática do ato devido. Assim, a ação de condenação pode ser pedida quando a) a Administração não profira decisão, b) recuse a prática de um ato devido ou c) recuse a apreciação de um determinado requerimento dirigido à prática de um ato.
O pressuposto descrito no artigo 67.º n.º1 alínea a) é a situação em que a Administração, passado o prazo legal para decidir sobre a pretensão formulada pelo interessado, nada faz. Antes da consagração da ação de condenação ao ato devido, existia a figura do indeferimento tácito, que era outro meio processual para agir quanto a situações de inércia. Passado o prazo para decidir, ficcionava-se um ato de indeferimento de forma a permitir ao interessado impugnar contenciosamente aquela situação. O CPTA eliminou este ato de indeferimento mediante derrogação do artigo 109.º n.º 1 do CPA, sendo agora permitido ao particular obrigar a Administração a decidir, não sendo necessário o recurso a uma ficção legal de indeferimento.
A alínea b) do artigo 67.º n.º 1 trata da situação em que existe a prática de um ato, mas esse ato é um ato de recusa. Está aqui em causa um indeferimento de mérito em que a Administração decidiu desfavoravelmente face à pretensão deduzida pelo interessado. Esta recusa pode ser a recusa da prática de um ato de conteúdo vinculado ou mesmo o preenchimento de conceitos indeterminados.
A terceira situação descrita na alínea c) do artigo 67.º n.º1 do CPTA é aquela em que a Administração se recusa a pronunciar-se sobre o objeto do requerimento.
O essencial é que o requerimento tenha constituído a Administração num dever de agir e não o tenha feito. Assim, perante um ato de conteúdo negativo, o interessado poderá propor ação de condenação à prática do ato devido, sendo ato “devido” aquele que, de acordo com o interessado, deveria ter sido emitido pelo Administração mas não foi.

4.         O particular pode, também, propor uma ação administrativa comum de condenação da Administração à prática de um determinado dever de prestar, nos termos do artigo 37.º n.º 2 alínea e). Esta ação de prestação pode ter por objeto o pagamento de quantias, a entrega de coisas ou a prestação de factos. Para que o particular possa propor esta ação de prestar é necessária a existência de uma vinculação por parte da Administração aos deveres de prestar, e que essa vinculação resulte de uma norma ou ato administrativo anterior. Portanto pressuposto essencial é que a obrigação da Administração esteja já definida por ato jurídico anterior. Assim, na falta de cumprimento, estaremos apenas perante uma recusa de atuação.

5. A distinção entre a ação administrativa especial de condenação da Administração ao ato devido e o ato administrativo comum de condenação à pratica de prestações devidas passa pelo conceito de ato administrativo.
José Vieira de Andrade desdobra o conceito de ato administrativo em conceito substantivo e conceito adjetivo. O conceito substantivo de ato administrativo é-nos fornecido pelo artigo 120.º do CPA, e que se traduz em todas as “decisões dos órgãos da Administração que, ao abrigo de normas de direito público, visem produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta”. Já o conceito adjetivo surge no artigo 51.º enquanto ato administrativo impugnável, sendo portanto aquele que produz eficácia externa, ainda que inserido num procedimento, e que seja capaz de lesar direitos ou interesses legalmente protegidos.
Definido o conceito, cabe analisar os dois tipos de ação e verificar se estamos perante atos administrativos ou não, visto que a sua presença, ou não, tem implicações diferentes consoante se trate da ação comum de prestar ou a ação especial de condenação.
No ato de condenação à prática do ato devido, estamos perante uma situação em que i) houve total inércia da Administração, não tendo sido analisado o requerimento, ii) houve um indeferimento expresso ou iii) uma recusa de apreciação. No caso de omissão administrativa e recusa de apreciação, não há dúvidas de que estamos perante um ato administrativo.
O caso que se afigura mais complicado, é o caso de indeferimento do artigo 67.º n.º1 alínea b). Ora neste caso estamos perante um ato negativo expresso. Este ato é uma decisão de um órgão da Administração, tomada ao abrigo de normas de direito público e que produz efeitos numa situação individual e concreta. No entanto duvida-se que o indeferimento tenha a força decisória de um ato administrativo, visto que estamos aqui perante uma verdadeira recusa da prática do ato devido. Portanto o indeferimento, embora seja uma ação, equivale, da perspetiva da esfera jurídica do particular, a uma “não ação”, na medida em que a sua pretensão não foi atendida. José Vieira de Andrade é da opinião de que se deve adotar um conceito estrito de ato administrativo. Esse conceito estrito,    que corresponde a uma estatuição de autoridade, produzida por um órgão administrativo, que visa definir estavelmente a situação jurídica dos particulares num caso concreto e com efeitos externos, permite-nos, assim,  aceitar o indeferimento enquanto verdadeiro ato administrativo.

6.         Na ação administrativa comum de condenação da Administração à prática de uma determinada prestação prevista no artigo 37.º n.º 2 alínea e), também temos de ver se o ato de prestar é ou não um ato administrativo. Isto porque o seu pressuposto de aplicação é que a prestação não seja um ato administrativo, mas sim uma obrigação definida por um ato administrativo prévio.
Como vimos a ação de prestação dirige-se ao cumprimento de deveres obrigacionais que normalmente são exigíveis no âmbito da administração de prestações, tais como o pagamento de remunerações, de pensões e benefícios da Segurança Social e prestações de cuidados de saúde ou educação.
Esta ação administrativa comum de condenação da Administração a prestar tem como pressuposto necessário que a obrigação esteja previamente definida por um ato jurídico anterior ou por uma norma imediatamente operativa. Assim, caso a Administração não realize a prestação, esse ato deve ser entendido como uma mera atuação material de recusa.
Enquanto as prestações decorram, com clareza, de atos administrativos prévios, não se colocam problemas. Por exemplo, existir um Despacho que determina o pagamento de 400€ a título de reforma. Podem, no entanto, surgir situações controversas quando, partindo do mesmo exemplo, o âmbito de aplicação não seja claro e haja necessidade de determinar quem beneficia da pensão; ou então ser necessário posterior ajustamento no cálculo das pensões. Nesses casos, havendo necessidade de um ato administrativo, pode tornar-se mais difícil o enquadramento da situação como sendo um ato sujeito a ação comum ou ação especial.
Para que se possa autonomizar esta figura face à ação de condenação, tem sido adotado um conceito restrito de ato administrativo passando a entender-se como “decisão” ou “ato regulador”. Assim, o conceito de ato administrativo permite distinguir entre uma ação administrativa comum de condenação a prestar e uma ação administrativa especial de condenação à prática do ato devido.

O ato administrativo funciona, assim, como a pedra de toque da delimitação do campo de aplicação destes dois tipos de ação. As implicações práticas são muito relevantes e é fulcral fazer bem a distinção visto que as consequências, em termos de prazo para a propositura das ações, podem fazer toda a diferença para o particular, visto que a ação administrativa comum pode ser proposta a todo o tempo (artigo 41.º n.º 1 do CPTA), enquanto que a ação especial prevê o prazo máximo de um ano (artigo 69.º do CPTA). 

Bibliografia

Carlos Alberto Fernandes CadilhaDicionário de contencioso administrativo, Coimbra, Almedina, 2006, p. 25 e ss.

José Carlos Vieira de AndradeA ação de condenação à prática de ato devido, A reforma da justiça administrativa, Coimbra, Coimbra Editora, 2005, p.169 e ss.

José Carlos Vieira de AndradeLições de Direito Administrativo, 2ª edição, Coimbra, 2009, p. 129 e ss.

José Carlos Vieira de AndradeA Justiça administrativa (Lições), 10ª edição, Coimbra, Almedina, 2009, p. 209 e ss.

Mário Aroso de AlmeidaComentário ao código de processo nos Tribunais Administrativos, 3ª edição, Coimbra, Almedina, 2005, p.171 e ss.

Mário Aroso de Almeida, O novo regime do processo nos tribunais administrativos, Coimbra, Almedina, 2005, p. 189 e ss.

Mário Aroso de AlmeidaManual de Processo Administrativo, Coimbra, Almedina, 2010, p. 316

Vasco Pereira da SilvaO Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise, 2ª edição, Almedina, 2009, p. 377 e ss. 








Do Processo Urgente




No Direito Contencioso Administrativo temos dois meios processuais, processo não urgente e processo urgente. Como vimos anteriormente, o meio processual não urgente segue duas formas, acção administrativa especial e acção administrativa comum. Por outro lado, no meio processual urgente temos um leque maior de formas processuais possíveis. Nos termos do artigo 36.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, de ora em diante CPTA, aplicamos a forma processual urgente nos processos relativos a:
Contencioso eleitoral – artigos 97.º e seguintes;
Contencioso pré-contratual – artigos 100.º e seguintes;
Intimação para prestação de informações, consulta de documentos ou passagem de certidões – artigos 104.º e seguintes;
Intimação para defesa de direitos, liberdades e garantias – artigos 109.º e seguintes

A forma processual urgente tem como característica principal, daí o nome, a celeridade com que o processo é conduzido, este elemento de celeridade reflecte-se não só no processo em si como no prazo legalmente estabelecido para intentar acção. Isto acontece para que o particular, em casos excepcionais, consiga uma decisão sobre o mérito da causa em tempo útil, visto que os processos urgentes visa garantir o efeito útil da decisão, objectivo que não seria conseguido pela tramitação normal dos processos não. Desta breve explicação retiramos que os processos urgentes são situações excepcionais, especialmente regulados no CPTA como tal e, fora deste número restrito de situações, o processo terá de seguir os meios regulares. Dito isto, fica uma dúvida por esclarecer, será que, em caso de um particular deixar passar o prazo de processo urgente pode, através do processo não urgente, intentar acção para reivindicar o seu direito? A resposta tem de ser negativa. O processo urgente é um meio imperativo, dentro das situações previstas na lei, é o único meio processual à disposição do particular.

De seguida, analisamos cada um dos meios processuais do processo urgente.
Quanto ao contencioso eleitoral, que tem como objecto as eleições que respeitem a organizações administrativas, meio de resolução de questões ou problemas que surjam no âmbito de eleições em entidades administrativas, ao abrigo do artigo 97.º. Tem legitimidade para intentar acção de impugnação de actos eleitorais “quem, na eleição em causa, seja eleitor ou elegível ou [...] pelas pessoas cuja inscrição haja sido omitida” (n.º 1 do artigo 98.º. O prazo para intentar acção é de sete dias a contar da data em que o lesado possa ter conhecimento do acto ou da omissão de acto, à luz do n.º 2 do mesmo artigo. Os prazos da restante tramitação encontram-se expostos no artigo 99.º, n.º 3, cinco dias para contestação e alegações, cinco dias para decisão do juiz ou relator e, por fim, três dias para os casos restantes. Este processo segue a tramitação da acção administrativa especial, nos termos do artigo 99.º, n.º 1, com regras específicas quanto ao seu carácter urgente, como acima mencionado.

No que toca ao contencioso pré-contratual, antes de mais, este apenas se pode aplicar à formação de contratos de empreitada e concessão de obras públicas, de prestação de serviços e de fornecimento de bens. Todas as situações que se encontrarem fora desta lista, presente no artigo 100.º, n.º 1, não constituem possibilidade de aplicação de contencioso pré-contratual. O n.º 2 acrescenta ainda que podem também ser impugnados através desta via processual os programas, cadernos de encargos ou quaisquer outros documentos conformador do procedimento de formação dos contratos em causa. Os prazos neste meio são bastante curtos, embora maiores que na anterior. O lesado tem um mês desde a data em é notificado do acto administrativo ou, em caso de não existir notificação, a partir do momento em que toma conhecimento do acto (artigo 101.º). Este meio processual tem como objecto a existência de ilegalidades de decisões administrativas no que concerne a formação dos contratos elencados anteriormente. Aplicamos, por força do artigo 101º os pressupostos de impugnação dos actos, devendo por isso o processo seguir a forma de acção administrativa especial, com as devidas ressalvas.
O contencioso pré-contratual abre ainda uma janela ao tribunal de, nos termos do artigo 103.º, optar pela via de uma audiência pública para uma mais fácil e rápida esclarecimento da questão.

No caso de intimação para prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões, este meio tem como requisitos a violação do dever de informação legalmente estabelecido, seja durante um processo ou no acesso aos arquivos e registos administrativos, como se encontra explanado no artigo 104.º. Este meio também se encontra ao dispor do Ministério Público, n.º 2 do 104.º. Tem, como objecto, a inobservância do dever de informação por parte da administração. Mais, tem legitimidade para intentar uma acção nestes moldes quem for titular de um direito de informação ou, em caso de utilização da informação para efeitos impugnatórios, todo aquele que tenha legitimidade para intentar acção de impugnação do acto administrativo em causa. O prazo deste meio processual é de vinte dias a partir do momento em que se verifica um dos factos elencados nas várias alíneas do artigo 105.º. O juiz deve atribuir à entidade requerida um prazo de dez dias para responder ao pedido, quer esta apresente resposta ou se mantenha em silêncio tendo decorrido o prazo deve o juiz apresentar decisão (artigo 107.º).

Finalmente, temos a intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias. Não só este meio processual se encontra previsto e especialmente regulado nos artigos 109.º a 111.º, como também na Constituição, nomeadamente no artigo 20.º, n.º 5, que garante a defesa de direitos, liberdades e garantias através de meios judiciais céleres. Este meio processual encontra-se à disposição, nos termos do artigo 109.º, nas situações em que seja “[...] indispensável para assegurar um exercício, em tempo útil, de um direito, liberdade ou garantia [...]” a adopção de uma conduta positiva ou negativa por parte da Administração ou de um concessionários (n.º 2 do artigo 109.º). A celeridade da decisão impõe-se de forma a evitar a deterioração ou inutilização de um direito. Tem legitimidade para intentar acção nestes moldes quem for titular de um direito, liberdade ou garantia que se encontre em especial perigo. A tramitação deste meio processual segue, regra geral, a descrita no artigo 110.º, mas também pode seguir uma forma especial se a urgência da situação o justificar, à luz do artigo 111.º, nomeadamente nos casos em que a lesão para o particular seja iminente e de carácter irreversível. Aqui, a lei oferece a possibilidade de se resolver o caso via audiência oral, no prazo de 48 horas (artigo 111.º, n.º 1). Para finalizar, as decisões improcedentes sobre a matéria de direitos, liberdades e garantias, são sempre recorríveis independentemente do valor da acção, nos termos do artigo 142.º, n.º 3, alínea a).
Concluindo, os meios processuais urgentes são prova da gravidade do problema que atinge a maioria do sistema judicial português, a morosidade das decisões, com todos os encargos e consequências que essa mesma lentidão judicial possa ter. Reconhecendo o problema e, ainda mais que isso, procurando uma solução para casos cuja não resolução em tempo útil implique uma erosão ou mesmo destruição do direito do particular e, por conseguinte, a inutilidade de uma eventual decisão judicial, o legislador criou esta forma de processo a título excepcional. Não obstante tratar-se de um meio processual muito restrito, consideramos que é uma forma essencial à garantia e protecção de certos direitos que, pela sua fragilidade e efemeridade, não seriam tutelados de forma satisfatória por qualquer outro meio processual.

Joel David Cruz Rodrigues
N.º 19689


Do Dano da Perda de Sentença e o Contencioso Pré-Contratual Urgente

É por todos os operadores jurídicos conhecida a circunstância de, com a Reforma de 2002/2004, o juiz, à face deste diploma, ter aumentado exponencialmente a sua relevância no concernente à marcha do processo. Aliás, VASCO PEREIRA DA SILVA refere mesmo que, independentemente dos meios processuais em causa, o juiz é dotado da plenitude dos poderes necessários à tutela plena e efectiva dos direitos dos particulares[1]. Ora, este papel do juiz encontra uma das suas manifestações mais acentuadas no mecanismo da modificação objectiva da instância, consagrado para o contencioso pré-contratual urgente, no artigo 102º/5 do CPTA e, no que toca às acções administrativas especiais e comum, no artigo 45º do mesmo diploma.
Importa começar por referir, com VIEIRA DE ANDRADE, que o preceito traduz uma “antecipação” do que pode suceder em sede de execução da sentença[2]. No fundo, é concedida ao juiz a possibilidade de conhecer e ditar agora o que sempre iria ditar e conhecer depois. De forma ilustrativa, poder-se-á dizer que o objectivo visado é que o juiz, perante a existência de “situações excepcionais” que tornam licita a inexecução de uma sentença, obrigue, no entanto, a Administração a pagar uma indemnização compensatória ao titular do direito à execução. Como revela AROSO DE ALMEIDA[3] processa-se uma inversão do risco que acarreta o decurso do tempo, que passa a correr por conta do autor do acto ilegal que, caso o tribunal decida no sentido da procedência do pedido de anulação (ou declaração de nulidade ou inexistência) do acto posto em crise, terá de, em caso de causa legítima, indemnizar o autor da acção. De um ponto de vista mais técnico, dir-se-á que o processo declarativo termina com a emissão de uma sentença cuja execução, se necessária, deixará de comportar momentos declarativos, incluindo apenas uma fase executiva que seguirá o processo de execução de pagamento de uma quantia certa.
Uma questão que, por vezes é suscitada na doutrina, e que, apesar de acessória, surge como pressuposto de aplicabilidade deste regime é o da natureza do caso jugado e dos seus efeitos quanto à declaração de anulação de actos administrativos. Isto é, caso o autor não opte pela cumulação do pedido de anulação do acto impugnado e de condenação da Administração à reconstituição da situação actual hipotética ainda será de permitir a aplicabilidade deste regime? Repare-se que, como salienta VASCO PEREIRA DA SILVA[4], pode-se tornar inconveniente tal cumulação, caso a mesma comprometa a natureza urgente e a celeridade do processo, além do eventual aumento do valor da acção. Parece, com VERA EIRÓ, que, caso não exista cumulação, tal efeito não é possível[5], na medida em que estabelecendo o artigo 175º/2 que pode, em sede de execução de sentença de anulação, ser invocada uma causa legitima de inexecução da sentença fundada em circunstâncias não supervenientes ao momento em que aquela foi proferida, daí se deve retirar a conclusão de não ser possível a invocação da causa legitima de inexecução em sede declarativa. Como tal, sendo apenas requerido ao Tribunal que se pronuncie sobre a invalidade do acto, não se afigura racional que se pronuncie, de forma antecipada, sobre os deveres em que a Administração fica constituída para que possa ser feito o juízo, também este antecipado, da existência de uma “impossibilidade de execução”.
Uma vexata quaestio de toda esta problemática é a do fundamento da obrigação de indemnizar. Por um lado, parte da doutrina considera que o facto que se encontra na origem da obrigação de indemnizar, apoiando-se na letra da lei, é o “facto de inexecução da sentença”[6]. Aliás, o grande “fundador ou criador” desta corrente foi DIOGO FREITAS DO AMARAL, pioneiro na defesa de que o nascimento para a entidade incumbida da execução de uma obrigação de indemnização sê-lo-ia pelos danos sofridos com a inexecução[7]. Do outro lado, encontramos autores, como RODRIGO ESTEVES DE OLIVEIRA, que entende estarmos antes perante uma indemnização devida pelo acto inicialmente inválido[8]. De notar é, ainda, a posição expressada no voto de vencido de ROSENDO JOSÉ, no Acórdão do STA de 13/03/2003, em que considera “não existir, na verdade, situações de impossibilidade de execução de sentenças, porquanto será sempre possível a execução por substitutivo – a indemnização – devendo inverter-se o ónus da prova do nexo de causalidade, cabendo à Administração o ónus de reconstituir o procedimento para ficar definido se o recorrente que teve ganho de causa no recurso teria ou não direito a indemnização”.
Parece-nos, com o devido respeito, que deve operar-se uma distinção entre a relação jurídica processual e a relação jurídica substantiva que se traduz na distinção entre o direito de acção e o direito subjectivo de que o particular é titular, no âmbito de uma concreta relação jurídica administrativa, e para cuja protecção o primeiro existe. Também VASCO PEREIRA DA SILVA parece ir neste sentido[9]. Como refere AROSO DE ALMEIDA[10] e VERA EIRÓ[11], a execução da sentença inclui-se tanto na relação jurídica substantiva (quando se pretenda incluir aqui os efeitos substantivos da decisão do tribunal) como na relação jurídica processual, pois corresponde, na verdade, ao culminar da acção. O que este mecanismo proporciona é a transformação desta relação jurídica processual numa nova relação jurídica substantiva: o autor, quando alegue ter um direito directo e pessoal na acção, tem direito a uma sentença do tribunal e à sua execução. Esta relação é nova e funda-se na existência de um juízo antecipado de uma causa legitima de inexecução da sentença[12]. O facto que dá origem à obrigação de indemnizar consagrada no artigo 102º/5 do CPTA é, na letra da lei, omitido. Todavia, e considerando a natureza “antecipatória” do regime, bem como a unidade do sistema jurídico, a ratio legis aponta no sentido de que também aqui se está perante um montante de indemnização devida pelo facto de inexecução da sentença, além de que a teleologia do instituto não é a de substituir todo o regime da responsabilidade extracontratual por acto ilícito das entidades demandadas junto dos tribunais administrativos. Aliás, como se tem entendido, para que haja ilicitude não basta a mera ilegalidade de uma actuação da Administração[13]. Terá, pois, de se exigir uma ilegalidade qualificada, porquanto dever-se-á exigir que as normas ou princípios violados revelem uma intenção normativa de protecção do interesse do particular lesado. Ou seja, a consideração pelo tribunal de vícios que inquinam (e invalidam) o acto (que deve ser conhecida pelo tribunal enquanto questão prévia da modificação objectiva da instancia) pode não ser suficiente para gerar, por exemplo em conformidade com o artigo 6º do DL nº 48051, uma obrigação de indemnizar.
Após a análise de todos estes pontos é nos perceptível que este regime põe em confronto “dois interesses públicos”. Por um lado o que se opõe à execução da sentença. Por outro, o de a Administração cumprir as leis e acatar as decisões dos tribunais. Facilmente se depreende que, quando existir uma situação de causa legitima de inexecução, o primeiro interesse público prevalece sobre o segundo, ficando a Administração constituída no dever de indemnizar.
Quanto à causa relativa à grave lesão do interesse público, parece de seguir o entendimento de DIOGO FREITAS DO AMARAL, quando o mesmo considera tratar-se de uma lógica análoga àquela que vigora para o instituto das expropriações, isto é, ponderar os interesses em causa e dar como prevalecente o interesse público[14]. AROSO DE ALMEIDA aproxima a figura, de igual modo, do estado de necessidade de salvaguardar interesses considerados mais importantes sendo, contudo, obrigatório o pagamento de uma indemnização[15]. Já quanto à causa da impossibilidade, baseia-se a mesma na máxima ad impossibilita nemo tenetur, devendo defender-se que a mesma consubstancia uma categoria autónoma da anterior, devendo, para tal, ser encarada de forma objectiva, como circunstância cujo reconhecimento não envolve a formulação de qualquer juízo valorativo e que sempre teria de ser admitida como fundamento para a inexecução de uma sentença
Contudo, a doutrina tem-se vindo a dividir quanto ao tipo de responsabilidade envolvida neste tipo de situações. De um lado encontramos DIOGO FREITAS DO AMARAL[16] que argumenta estar em causa uma responsabilidade por facto lícito, baseado na ideia de que o facto constitutivo da responsabilidade seria a execução a que a Administração teria procedido do acto impugnado. Parece-nos, salvo o devido respeito, não ser esta a solução a adoptar. Repare-se que a causa legitima de inexecução pode advir de uma alteração legislativa ou de operações materiais levadas a cabo por outra entidade que não o autor do acto, não sendo de aplicar, nestes casos, uma responsabilidade civil por acto licito como fundamento da obrigação de indemnizar. Por seu turno, AROSO DE ALMEIDA considera que o acto não deixa de ser ilegal e, por isso, de ser potencial fonte de responsabilidade civil da Administração pelos danos que tenha causado e que a execução da sentença nunca seria apta a eliminar[17]. O que existiria, isso sim, seria uma obrigação de indemnizar ainda com origem na causa geradora da situação ilegal – o acto inicialmente ilícito – mas por via de um “terceiro degrau de tutela”: a responsabilidade objectiva pelo acto ilegal, não havendo todavia o dever geral de reparação integral dos danos.
Quanto a nós, é de entender que a quebra do nexo de causalidade é suficiente para se concluir que o fundamento desta obrigação de indemnizar não passa por uma responsabilidade pela prática do acto ilícito (nem da forma mitigada, como propõe AROSO DE ALMEIDA)[18], e isto porque a causa legitima de inexecução encontra justificação na prevalência de um interesse publico face ao interesse do privado na execução da sentença e na imposição de um sacrifício que se prende com a desnecessidade de uma conduta processual. Mesmo no concernente ao segundo tipo de casos, tal é comprovado pela inexistência de um efeito suspensivo imediato associado à mera propositura das acções administrativas. Além do mais, tal entendimento levaria a uma transfiguração radical dos pressupostos da responsabilidade civil que não parece ser minimamente “desejado” pelo preceito em causa. Aliás, atente-se, com MARIA LÚCIA AMARAL[19], que é dotada de particularidades a situação que ocorre sempre que o Estado prejudica "sem querer". O dever de indemnizar só existe a partir do momento em que o dano se produz, porque este não foi querido nem previsto pelo acto de vontade. Parece que, neste tipo de situações, a actuação pública gerou o dever mas não nasceu com ele, apenas foi fonte de algo que logicamente lhe é posterior, dando origem a uma relação obrigacional nova que não existia nem podia existir antes da produção dos efeitos do acto. Como tal, o dever de indemnizar terá como fonte a responsabilidade civil. Ora, o busílis da questão é que, nos casos que estamos a investigar, a indemnização surge como parâmetro de valor da conduta da Administração (fundada num principio de justiça distributiva e não comutativa), que se não executar a sentença sem que seja atribuído o montante de indemnização devida ao autor, estará, ainda que justificada por uma causa legítima, a actuar de forma contrária ao bloco legal. Em suma, parece ser de concluir que esta obrigação de indemnização não se funda na responsabilidade civil da Administração, mas antes no princípio da tutela jurisdicional efectiva, por um lado, e num instituto próximo ao da expropriação, por outro[20].
Por fim, antes de entrarmos em questões de maior profundida técnica, nunca se deve esquecer, e esta é uma das principais consequências de tudo quanto foi defendido até ao momento, de que ao autor é sempre possível, além da indemnização a que tenha direito pela “perda” de sentença, intentar uma acção de responsabilidade civil para ser compensado de todos os danos causados pelo acto inicialmente ilícito, desde que preenchidos os pressupostos da responsabilidade civil por facto ilícito.
Quanto à exigência de impossibilidade absoluta importa notar, com AROSO DE ALMEIDA, que ao abrigo do principio da proporcionalidade, uma sentença que determina um desproporcionado sacrifício do interesse público é juridicamente impossível[21]. Contudo, parece ser de adoptar, neste ponto, a interpretação que prevaleceu no acórdão do STA de 11/04/2002, em que foi defendido que a ponderação de interesses é realizada apenas para efeitos de preenchimento do conceito de grave prejuízo para o interesse público, ou seja, para os casos dos do tipo da primeira situação analisada.
Cabe, por fim, analisar de forma critica o dever de indemnizar que cabe à Administração Pública e o montante dessa indemnização. Uma questão muito debatida na doutrina a este respeito foi a concernente à possibilidade de o autor e a entidade demandada acordarem uma indemnização, sem que haja um juízo antecipado de impossibilidade absoluta de execução da sentença. A este respeito VIEIRA DE ANDRADE[22] admite a possibilidade de transacção nestes casos, considerando que as causas legitimas de inexecução “têm de ser reconhecidas por acordo do interessado ou julgadas procedentes pelo juiz” e que o interessado poderá optar pela indemnização, mesmo fora das situações legalmente previstas como causas legitimas de inexecução. Quanto a nós, esta posição não se justifica. Não só porque no mecanismo de convolação objectiva da instância em processo declarativo não se prevê a possibilidade de os contra-interessados serem ouvidos, o que levaria, na falta de uma verdadeira impossibilidade absoluta, a postergar os interesses dos contra-interessados que revelem interesse na execução de uma sentença que venha invalidar o acto posto em crise. Além do mais, uma posição deste tipo levaria à debilitação do principio da legalidade e da ordem pública, deixando a decisão sobre uma determinada ilegalidade na livre disponibilidade das partes.
Quanto à obrigação de indemnização, parece decorrer do entendimento de AROSO DE ALMEIDA que não se trata tão-somente de uma responsabilidade processual, mas também de um regime substantivo que, nestes casos de impossibilidade de execução da sentença, faz nascer a obrigação de indemnização da existência de uma responsabilidade civil objectiva, portanto, independentemente de culpa, não sendo ressarcidos todos os danos sofridos[23]. Contudo, parece mais consentâneo ser de entender que o regime de responsabilidade se aproxima ao da expropriação. Como refere VERA EIRÓ, deixam de ser relevantes os pressupostos da responsabilidade civil, particularmente o elemento da ilicitude, uma vez que aquilo que está em causa é a existência de uma causa legitima de inexecução que quebra o nexo de causalidade com o acto inicialmente ilícito[24]. Como tal, mesmo que o juízo de mérito do juiz quanto à invalidade do acto conclua pela existência de um acto que, embora ilegal, não preencha o requisito da ilicitude em sede de responsabilidade civil, a constituição da Administração numa obrigação de indemnizar não depende deste requisito, sendo também de recusar importância à eventual culpa da Administração ou do lesado. Parece-nos ser este a posição a seguir.
Veja-se, ainda, que o conceito de “justa indemnização” importado do regime da expropriação terá que se aproximar do montante do dano devido pelo autor, sob pena de uma “sobreprotecção jurídica”. Na verdade, ainda que nos afastemos do instituto da responsabilidade civil como fonte desta obrigação de indemnização devida, não podemos olvidar que o que se pretende é ressarcir o dano de “perda de sentença”, e não sancionar a Administração por ter executado o acto posto em crise. A atribuição de indemnização não parece , neste caso, representar um fim principal de natureza sancionatória nem preventiva – porque não se pretende que a mera propositura de uma acção administrativa especial (no caso de contencioso pré-contratual de natureza urgente) maniete a acção da entidade demandada -, mas sim ressarcitória. Caso contrário, teria o legislador atribuído o efeito suspensivo automático associado à propositura de acções administrativas especiais – o que não fez. Defendemos, por isso, que deve haver lugar a uma indemnização do autor pela inexecução de uma sentença que, nos casos do artigo 102º/5 determinaria, regra geral, o reiniciar do procedimento de formação do contrato público objecto do procedimento de formação de contrato onde se integrou o acto impugnado.
Contudo, tendo em conta tudo quanto foi dito anteriormente, qual deve ser o dano a ser ressarcido?
Desde logo, com AROSO DE ALMEIDA, diremos que o dano de inexecução de sentença deve ser feita casuisticamente[25]. Em segundo lugar, não se deve perder de vista que o autor tem de ser ainda a possibilidade de ser ressarcido dos danos que tenha sofrido e que apresentem um nexo de causalidade com o acto inicialmente ilícito. Por ultimo, parece ser de considerar que o calculo da justa indemnização deve atender a critérios específicos, que não os consagrados no Código das Expropriações.
Estes critérios devem ser dois. Primeiro, e no seguimento do defendido por VERA EIRÓ[26], deve ser revelado o principio da igualdade. Repare-se que o autor, ao propor a acção, incorreu em despesas e fez um investimento dirigido, em primeiro lugar, à emissão de uma sentença favorável aos seus interesses e, em segundo lugar, à efectiva execução dessa sentença, levando a que estas despesas em que incorreu o coloquem numa situação de desigualdade que justifica uma compensação, devendo esta cobrir todos os custos do processo.
Quanto ao segundo critério, não obstante no acórdão do STA de 07/03/2006 ter-se considerado que, regra geral, os custos de proposta não são indemnizáveis por serem comuns a todos os concorrentes preteridos e representarem um risco de investimento, parece ser mais concordante com a Directiva 92/13/ CEE (artigos 2º/7 e 79º/4 do projecto de Código dos Contratos Públicos), a interpretação de que os custos associados à preparação da proposta assumem uma natureza de quantum mínimo de indemnização, devendo ser tomados em conta os custos associados à preparação da proposta.
Concluir-se-á a explanação deste tema com uma frase bastante ilustrativa de VERA EIRÓ: “afinal, esta indemnização devida corresponde a um montante que não terá equivalência com o cômputo do dano e a obrigação de indemnizar fundada na responsabilidade civil por acto ilícito”[27]. Contudo, importa relembrar que a atribuição desta indemnização depende do preenchimento de pressupostos menos exigentes do que os pressupostos da responsabilidade civil por acto ilícito – sendo que, em contratação pública, o pressuposto do nexo de causalidade corresponde, nas mais das vezes, a uma prova diabólica, pois, como tem vindo a reconhecer a jurisprudência comunitária, a actividade de avaliação das propostas é insindicável, dependendo o nexo de causalidade da demonstração de que não fora o acto impugnado, o autor teria sido o adjudicatário do contrato.
Conclua-se apenas com uma advertência. Como refere DIOGO FREITAS DO AMARAL, as causas legitimas de inexecução acarretam sempre algum risco para a construção de um Estado de Direito, na medida em que acaba por redundar na outorga à Administração da possibilidade, unilateral ou mediante acordo do particular, de se libertar do dever de reintegrar a legalidade ofendida por um acto administrativo ilegal anulado por sentença e do dever de reintegrar in natura as posições jurídicas subjectivas por si lesadas[28]. Aliás, como explicita MARCELLO CAETANO[29] as causas legítimas de inexecução vêm, afinal, revelar que o caso julgado administrativo é só condicionalmente obrigatório para a Administração, e que o direito dos particulares à execução das sentenças proferidas pelos tribunais administrativos é um direito condicionado. Por essa razão, deve ser este instituto somente aplicado quando dotado de uma especial prudência e rigor. Também MIGUEL PRATA ROQUE[30] afirma que a Administração Pública teima em manter a crença de que é, simultaneamente, mestrina e prima donna do baile mandado, em que a sua percepção unilateral daquilo que seria o interesse público se impõe, qualquer que seja a fase da tramitação processual. Foi por estas mesmas razões que VASCO PEREIRA DA SILVA considerou, em tempos, esta solução manifestamente inconstitucional[31] por violação do principio da separação de poderes e do principio do pedido. Contudo, hoje em dia tal preocupação já não faz sentido. Para terminar o trabalho diremos que a impossibilidade absoluta é uma causa objectiva cuja verificação não envolve qualquer espaço de reserva da função administrativa, assim como a exigência de um “excepcional prejuízo para o interesse publico” tão pouco confere uma margem de livre apreciação que deva ser protegida em detrimento dos outros valores jurídico-constitucionais que esta medida pretende salvaguardar. Quanto ao principio do pedido, hoje em dia, o pedido formal é menos relevante do que a pretensão formulada pelo autor ou do que a resolução global da situação litigiosa. Como tal, parece ser de concluir que a própria tutela jurisdicional efectiva justifica que o juiz possa conhecer, a partir dos elementos de facto que as partes aduziram ao processo, da existência de uma causa legitima de inexecução que obsta a uma tutela jurisdicional primária – à procedência especifica do pedido originário -, mas não a uma tutela secundária – à fixação de indemnização respectiva.



[1] VASCO PEREIRA DA SILVA, O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise, 2005, p. 264.
[2] VIEIRA DE ANDRADE, Justiça Administrativa, 2006, p. 410
[3] AROSO DE ALMEIDA, Anulação de actos administrativos e relações jurídicas emergentes, 2002, pp. 807-810.
[4] VASCO PEREIRA DA SILVA, Todo o Contencioso Administrativo se tornou de Plena Jurisdição,in Cadernos de justiça Administrativa, nº 19 (Jul.-Ago. 2002), p. 31.
[5] VERA EIRÓ, Estudos Comemorativos dos 10 anos da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, 2008, pp. 809-810.
[6] AROSO DE ALMEIDA, Anulação de actos administrativos e relações jurídicas emergentes, pp. 816-817; VIEIRA DE ANDRADE, Justiça Administrativa, p. 411.
[7] DIOGO FREITAS DO AMARAL, A Execução das Sentenças dos Tribunais Administrativos, 1997, p. 118.
[8] RODRIGO ESTEVES DE OLIVEIRA, Processo Executivo, Algumas Questões, p. 259.
[9] VASCO PEREIRA DA SILVA, O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise, 2005, p. 280-285.
[10] AROSO DE ALMEIDA, Anulação de actos administrativos e relações jurídicas emergentes, pp. 791-792;
[11] VERA EIRÓ, Estudos Comemorativos dos 10 anos da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, 2008, pp. 812-813.
[12] Parece-nos que esta distinção é de enorme importância, na medida em que da mesma resulta a consideração de que o autor poderá ser, simultaneamente, o credor de uma obrigação de indemnizar fundada na inexecução de uma sentença a seu favor e manter-se credor de uma outra obrigação de indemnizar fundada no acto inicialmente posto em crise.
[13] MARAGRIDA CORTEZ, Responsabilidade civil da Administração por actos administrativos ilegais e concurso de omissão culposa, in Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, 2000, p. 72.
[14] DIOGO FREITAS DO AMARAL, A Execução das Sentenças dos Tribunais Administrativos, p. 246.
[15] AROSO DE ALMEIDA, Anulação de actos administrativos e relações jurídicas emergentes, pp. 783-784.
[16] DIOGO FREITAS DO AMARAL, A Execução das Sentenças dos Tribunais Administrativos, pp. 131-135.
[17] AROSO DE ALMEIDA, Anulação de actos administrativos e relações jurídicas emergentes, pp. 814-817.
[18] No mesmo sentido, VERA EIRÓ, Estudos Comemorativos dos 10 anos da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, 2008, p. 816.
[19] MARIA LÚCIA AMARAL, A Responsabilidade do Estado e o Dever de Indemnizar do Legislador, 1998, pp. 415-416.
[20] No seguimento do pensamento de VERA EIRÓ, Estudos Comemorativos dos 10 anos da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, 2008, pp. 817-818.

[21] AROSO DE ALMEIDA, Anulação de actos administrativos e relações jurídicas emergentes, pp. 787-788.
[22] VIEIRA DE ANDRADE, Justiça Administrativa, p. 409.
[23] AROSO DE ALMEIDA, Anulação de actos administrativos e relações jurídicas emergentes, p. 793.
[24] VERA EIRÓ, Estudos Comemorativos dos 10 anos da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, 2008, p. 832.
[25] AROSO DE ALMEIDA, Anulação de actos administrativos e relações jurídicas emergentes, p. 820.
[26] VERA EIRÓ, Estudos Comemorativos dos 10 anos da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, 2008, p. 836.
[27] VERA EIRÓ, Estudos Comemorativos dos 10 anos da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, 2008, p. 838.
[28] DIOGO FREITAS DO AMARAL, A Execução das Sentenças dos Tribunais Administrativos, pp. 131-141.
[29] MARCELLO CAETANO, apud DIOGO FREITAS DO AMARAL, A Execução das Sentenças dos Tribunais Administrativos, p. 156.

[30] MIGUEL PRATA ROQUE, “Alto e pára o baile!”– O excepcional prejuízo para o interesse público como mera causa de inexecução da decisão cautelar - acórdão do TCA Sul de 17/3/2011 , in Cadernos de Justiça Administrativa nº 97, p. 47.
[31] VASCO PEREIRA DA SILVA, Todo o Contencioso Administrativo se tornou de Plena Jurisdição,in Cadernos de justiça Administrativa, nº 19 (Jul.-Ago. 2002), p. 30.





Diogo Coelho, nº 22003