As formas de
processos administrativos não-urgentes encontram-se, hoje em dia, divididas em
duas modalidades principais: acções administrativas especiais e acções
administrativas comuns. Esta opção dual foi estabelecida com a entrada em vigor
da reforma de 2002/2004 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, de
ora em diante CPTA. Encontramos esta dicotomia plasmada nos artigos 37.º e
seguintes para a acção administrativa comum, e 46.º e seguintes para a acção
administrativa especial.
A distinção
entre uma e outra baseia-se na forma de acção da administração pública, não só
segundo a doutrina, como também de acordo com a jurisprudência que defende este
critério. Mais concretamente, se estivermos perante pretensões derivadas do
exercício de poderes de autoridade de administração, o processo seguirá a forma
de acção administrativa especial; pelo contrário, quando isto não aconteça
seguiremos a tramitação de acção administrativa comum.
“A acção
administrativa especial é um meio processual principal do Contencioso
Administrativo” – Professor Vasco Pereira da Silva. Segundo o artigo 42º, n.º2
constituem pedidos da acção administrativa especial as seguintes pretensões:
- Anulação de Acto Administrativo;
- Condenação à prática de Acto Administrativo legalmente devido;
- Declaração de ilegalidade de normas regulamentares ilegais;
- Declaração de ilegalidade pela não emissão de regulamentos.
Mais,
constituem acção administrativa especial todas aquelas que, em caso de cumulação
de pedidos, tenha um ou mais pedidos que integrem a forma de acção
administrativa especial.
Os pressupostos
processuais comuns a todos os meios processuais são a legitimidade (artigos 9.º
e seguintes do CPTA), o patrocínio judiciário (artigos 11.º) e competência do
tribunal (artigos 13.º e seguintes do CPTA). Cada uma das diferentes
modalidades de acção administrativa especial tem pressupostos processuais
próprios.
A anulação de
acto administrativo requer, para além dos pressupostos gerais, que exista um
acto administrativo impugnável. Quanto à acção de condenação à prática de acto
administrativo legalmente devido, o artigo 67.º do Código de Processo
Administrativo cria três hipóteses de aplicabilidade diferentes, nomeadamente,
e em primeiro lugar, a situação em que não tenha sido proferida decisão dentro
do prazo legalmente estabelecido, a situação em que foi recusada a prática do
acto devido e, por fim, uma situação em que tenha sido recusada a apreciação de
requerimento dirigido à prática do acto. Os pressupostos de aplicação da
declaração de ilegalidade de normas regulamentares ilegais são a legitimidade e
procedibilidade dos regulamentos, o interesse (artigo 73.º, n.º 1 do CPTA) e,
por fim, a oportunidade do pedido de impugnação (artigo 74.º do CPTA para
pedido de impugnação por nulidade). Por último, no âmbito da declaração de
ilegalidade pela não emissão de regulamentos, o artigo 77.º, n.º 1 remete-nos
para as regras gerais da legitimidade da acção para defesa de direitos.
No outro
extremo temos a chamada acção administrativa comum, a qual se distingue da
especial na medida em que versa sobre todas as matérias que não estejam
especialmente reguladas quer no CPTA, quer em legislação avulsa, o que resulta
do artigo 37.º, n.º 1 do CPTA. Esta forma de processo não-urgente reencaminha a
tramitação processual administrativa para o Processo Civil, ou seja, no âmbito
da acção administrativa comum, o processo segue a tramitação do processo
declarativo do Processo Civil. Assim, as situações elencadas nas várias alíneas
do n.º 2 do artigo 37.º do CPTA são alguns exemplos de acções administrativas
comuns.
Finda a
explicação dos conceitos e modalidades das acções administrativas especiais e
comuns, resta-nos falar sobre a cumulação de pedidos e de como isto afecta o
Processo Administrativo. A lei permite, à luz, não só do princípio da livre
cumulação de pedidos plasmado no artigo 4.º do CPTA, como também do artigo 47.º
do CPTA, que o autor faça vários pedidos ao tribunal para que este afira o
mérito. O n.º 1 desse mesmo artigo introduz um critério de relação material de
conexão entre os vários pedidos. Este critério, nos termos da lei actual, é
bastante amplo o que tem como consequência a facilidade de se intentar acções
administrativas com um grande leque de pedidos. Mais, resulta do n.º 2 do
artigo 47.º que os pedidos típicos de acção administrativa especial em conjunto
com um ou mais pedidos típicos de acção administrativa comum assumirão a forma
de acções administrativas especiais.
Considerando
tudo o que foi anteriormente dito, é-nos possível verificar que as várias
modalidades da acção administrativa especial abarcam o grosso das situações do
contencioso administrativo e ainda absorvem as acções administrativas comuns em
situação de cumulação de pedidos, o que aumenta em muito o espectro de
aplicação da acção administrativa especial face à comum. Assim, no dia-a-dia
judicial do Contencioso Administrativo, acabam por ser as acções
administrativas especiais a tornar-se mais comuns que as acções administrativas
comuns, de casuística bastante mais reduzida nos tribunais.
Para finalizar,
esta situação actual está longe de durar muito mais tempo. Retiramos que a
opinião doutrinária contrária a esta dualidade foi aceite pelo legislador a
partir, não só da exposição de motivos que antecedeu a proposta de lei de
autorização legislativa, como também do preâmbulo da proposta de revisão do
CPTA. Assim, é possível visualizar o que o futuro nos espera: uma unificação
das formas processuais não-urgentes do Direito Contencioso Administrativo
português.
Em conclusão,
tendo em conta o largo âmbito de aplicação das acções administrativas
especiais, em detrimento das acções administrativas comuns, pelos motivos
explanados acima, é possível afirmar que, hoje, as formas processuais
não-urgentes do Direito Contencioso Administrativo no nosso ordenamento
jurídico celebram uma dualidade bastante desigual, um sistema em que existe um
conceito de acção administrativa especial que não o é e um conceito de acção
administrativa comum que o pretendia ser.
Bibliografia:
- “O Anteprojecto de Revisão do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais em Debate” – Carla Amado Gomes, Ana Fernanda Neves, Tiago Serrão.
- “O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise” – Vasco Pereira da Silva
- Acordãos do Tribunal Central Administrativo do Sul, de 12 de Julho de 2012, Processo n.º 8510/12, e de 6 de Fevereiro de 2014, Processo n.º 10575/13.
Joel David Cruz Rodrigues
Aluno n.º 19689
Visto.
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