segunda-feira, 24 de novembro de 2014

A acção de declaração de perda de mandato dos autarcas: especialidade de uma remissão

             A Lei n.º 27/96, de 1 de Agosto, estabelece o regime jurídico da tutela a que ficam sujeitas as autarquias locais[1]. É nesta sede (nos seus arts. 11.º a 15.º) que se regula a acção de declaração de perda de mandato e dissolução de órgãos autárquicos, que pressupõe que os seus órgãos pratiquem, de forma individual ou colegial, por acção ou omissão, ilegalidades graves[2]. Ora, no n.º 1 do seu art. 15.º, prevê-se que a acção de declaração de perda de mandato de órgãos autárquicos tem carácter urgente, acrescentando o n.º 2 do mesmo preceito legal que esta acção segue a tramitação prevista no CPTA para a acção administrativa especial[3]/[4](AAE), i. e., o regime previsto nos arts. 78.º e ss. CPTA[5]. Assim, temos no n.º1 do art. 15.º da RJTAL a afirmação do carácter urgente desta acção, remetendo o n.º 2 do mesmo preceito legal para a tramitação de uma acção administrativa especial (naquele que é o entendimento da doutrina, como supra assinalado). É acerca desta remissão que temos as maiores dúvidas.
     A entrada em vigor do CPTA não teve o cuidado de articular a remissão feita pelo art. 15.º/2 do RJTAL - que era feita para os arts. 24.º e ss LPTA – tendo a doutrina entendido que a remissão é agora feita para a tramitação da AAE[6]. Parece claro que a reforma abriu uma lacuna remissiva, sendo que o que nos caberá aqui discutir é do sentido em que ela deve ser integrada. Apesar de o art. 36.º/1 CPTA ressalvar a existência de outras situações de urgência para além das quatro mencionadas nesse mesmo preceito legal, a definir em legislação avulsa – caso do RJTAL -, temos sérias dúvidas relativamente à compatibilidade (e da proximidade, no sentido de ser entendida com um caso análogo) da tramitação de uma acção urgente com a tramitação de uma acção administrativa especial (que se relaciona com a tutela de uma pretensão não urgente, configurando um tramitação mais morosa, exactamente pelo facto de não ser instituída em razão da obtenção de uma pronúncia sobre o mérito da causa por forma mais célere[7]).
   É sobre a (in)compatibilidade das referências que nos surgem nos n.ºs 1 e 2 do art. 15.º da RJTAL que nos vamos debruçar, tentando encontrar uma solução para harmonizar estas referências.
             Tendo presente este desiderato, faremos uma análise aos vários tipos de acção urgente presentes no CPTA, tentando perceber se há forma de poder subsumir a acção de declaração de perda de mandato a alguma delas.
         Desta forma, cabe analisar de forma sumária o actual contexto do contencioso administrativo, olhando, de forma muito sintética – por não ser fulcral para o presente estudo -, para o que se verifica em sede de processos não urgentes. Assim, o modelo de tramitação não-urgente desdobra-se em dois tipos de acções e também várias formas de tramitação. Assim, a acção administrativa comum (AAC) segue os mesmos termos da lei processual civil, pelo que a sua actual tramitação se define de acordo com o regime de tramitação estabelecido no CPC (art. 552.º e ss.). A acção administrativa especial, por seu turno, é um tipo que abrange apenas (elenco taxativo) os subtipos previstos no art. 46.º/2 CPTA, seguindo estes subtipos, em geral, a tramitação prevista nos arts. 78.º e ss. CPTA[8].

            Cumpre assim, e de acordo com o escopo do presente texto, analisar as formas processuais urgentes em sede de contencioso administrativo, aproveitando para indagar da similitude, ao nível do objecto e fundamentos destas formas processuais com a acção de declaração de perda de mandato. Neste sentido, seguem a forma urgente impugnatória, nos termos do art. 36.º CPTA os processos relativos ao contencioso eleitoral e ao contencioso pré-contratual. A tramitação urgente condenatória está prevista para os processos relativos à intimação para a prestação de informações, consulta de documentos ou passagem de certidões e os processos relativos à intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias. Por fim, têm também tramitação urgente, as providências cautelares – irrelevantes para o estudo empreendido, pelo facto de apenas conferirem uma tutela provisória, salvo a faculdade consagrada ao juiz pelo art. 121.º CPTA.
   Pese embora cada uma destas formas de processo possuir uma tramitação individual, mais ou menos agilizada, pré-estabelecida nas respectivas disposições legais, todas elas têm em comum o facto de tramitarem de acordo com uma forma urgente, tendo subjacente o mesmo fundamento, i.e., o «princípio da simplificação da estrutura dos meios processuais», que é um princípio de grande importância extraído do código[9].

         Partindo para a análise de cada uma destas formas de processo, cabe, desde já, afastar a possibilidade de subsumir a acção de declaração de perda de mandato aos dois processos a que o legislador apelidou de intimações. Assim, a intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões, contemplada nos arts. 104.º e ss CPTA tem por objecto uma pretensão cuja tutela de carácter urgente tanto pode ser necessária como não, tendo o legislador optado por lhe conferir carácter urgente, dando assim origem a um tipo de contencioso em que a urgência surge por determinação legal[10]. Esta pretensão é relativa ao exercício do direito fundamental dos cidadãos à informação administrativa (n.ºs 1 e 2 do art.268.º), nas modalidades de direito à informação procedimental (nos termos dos arts. 61.º a 64.º do CPA) e extra-procedimental ou direito de acesso aos documentos informativos e a sua reutilização, nos termos da Lei 46/2007[11].
   Já a forma de processo prevista para a intimação para a protecção de direitos, liberdades e garantias constitui um tipo de contencioso urgente por natureza, que cumpre a imposição legiferante presente no art. 20.º/5 CRP. Este tipo de acção está previsto nos arts. 109.º e ss. CPTA, tendo como objecto a protecção urgente de direitos, liberdades e garantias perante entidades públicas e privadas. A partir da leitura da Exposição de Motivos da respectiva proposta de Lei, verifica-se que o legislador pretendeu instituir um processo dotado de «grande elasticidade, que o Juiz [portador de uma missão especial e dotado de poderes excepcionais] deverá dosear em função da intensidade da urgência». Este é, portanto, um processo que está disciplinado por normas especiais e tem especificidades de vária índole. Nas palavras de AROSO DE ALMEIDA, este é um «modelo polivalente», não resultando desta polivalência a sua submissão a «quatro formas processuais distintas»[12], já que, apesar de poder assumir diversas configurações estruturais, fica sujeita à mesma forma urgente, ainda que com vários andamentos[13].

         Passamos, por conseguinte, à análise dos processos urgentes do contencioso eleitoral e do contencioso pré-contratual, que também adoptam o nome de impugnações urgentes[14].
               Em primeiro lugar, segue a tramitação urgente impugnatória a situação urgente relacionada com o procedimento de formação de quatro tipos de contratos públicos (contrato de empreitada e concessão de obras públicas, o contrato de prestação de serviços e o de fornecimento de bens). O procedimento pré-contratual deve obedecer aos princípios da legalidade, da livre concorrência, da igualdade e da imparcialidade, sendo que a situação de carência ou de desconsideração de qualquer destes princípios justifica o seguimento de tramitação urgente, já que pressupõe a iminência da celebração do contrato sem que tais princípios e outras normas tenham sido respeitadas e justifica a necessária correcção atempada das ilegalidades verificadas durante a formação dos contratos em causa. Este processo, que nos surge regulado no art. 100.º CPTA, resulta de uma imposição europeia, sendo que o seu objecto corresponde a dois tipos de pretensões relativas à formação de contratos de empreitada e concessão de obras públicas, de prestação de serviços e de fornecimento de bens: a impugnação de actos administrativos praticados durante a fase formativa (incluindo o procedimento pré-contratual) desses contratos e a impugnação de documentos normativos com fundamento na ilegalidade das especificações técnicas, económicas ou financeiras, i.e., de documentos normativos conformadores do procedimento de formação desses contratos, incluindo o programa e o caderno de encargos (nos termos dos n.ºs 1 e 2 do art. 100.º CPTA)[15].
                Note-se ainda que o objecto deste processo especial pode integrar outras pretensões, podendo o juiz declarar a invalidade de um destes contratos, se o mesmo vier a ser celebrado na pendência do processo, podendo ainda fixar o valor de indemnização a atribuir ao autor do processo, caso se tenha consolidado uma situação de impossibilidade que impeça o autor de obter uma restauração in natura da sua pretensão jurídica (102.º/4 e 63.º/5 CPTA)[16]. Face ao exposto, parece não ser possível identificar a acção de declaração de perda de mandato a esta acção, uma vez que os seus fundamentos e o seu objecto, se subsumem à álea do contrato administrativo sob judice (o que engloba o procedimento que o antecede).

               Cumpre, nesta medida, entrar na análise do processo urgente de contencioso eleitoral, previsto nos arts. 97.º e ss. CPTA. As pretensões de carácter urgente que fundamentam o recurso a esta forma de processo dizem respeito a um procedimento eleitoral irregular, que acaba por viciar o acto final desse procedimento, ou a um tipo específico de invalidade pré-eleitoral (referente ao acto de exclusão de eleitores ou de pessoas elegíveis), ou referentes ao acto eleitoral em si mesmo[17]. A resolução de questões eleitorais não se compadece com a demora normal dos processos, já que as sentenças de provimento não teriam a sua utilidade normal, pois que, em virtude da impossibilidade prática de reconstituição da situação hipotética, raramente seriam susceptíveis de execução específica (quer pela brevidade e urgência do processo eleitoral, quer pela duração limitada dos mandatos)[18]. Estas formas de processo têm por objecto as eleições que respeitam a organizações administrativas, desde que não subtraídas à jurisdição administrativa, id est, aquelas que servem como meio para designar os titulares de órgãos administrativos electivos de pessoas colectivas públicas, sobretudo no âmbito da administração autónoma[19], incluindo também as eleições para órgãos não burocráticos da administração directa ou indirecta, no âmbito das universidades, das escolas e de outros estabelecimentos e serviços públicos[20].
   Cabe, assim, perceber se existem, ao nível do fundamento e do objecto, homogenias que permitam identificar como semelhante a forma de processo urgente do contencioso eleitoral e a acção de declaração de perda de mandato[21]. Nesta senda, deve verificar-se dos fundamentos da primeira, analisando-se quais os intentos da segunda.
                Como supra explanado, a forma de processo urgente de contencioso eleitoral funda-se na tutela de direitos fundamentais – o direito de eleger e de ser eleito, consagrados nos arts. 49.º e 50.º CRP -, sendo-lhe conferido carácter urgente por via da brevidade do processo eleitoral e pela duração limitada dos mandatos. A acção de declaração de perda de mandato, por seu turno, tem em vista a restrição de um direito fundamental – o direito ao acesso e ao exercício de cargos públicos, consagrado no art. 50.º/1 CRP -, sendo que as causas de perda de mandato são elencadas no art. 8.º do RJTAL, incorrendo em perda de mandato os membros dos órgãos autárquicos ou das entidades equiparadas que: sem motivo justificativo, não compareçam a 3 sessões ou 6 reuniões seguidas ou a 6 sessões ou 12 reuniões interpoladas; após a eleição, sejam colocados em situação que os torne inelegíveis ou relativamente aos quais se tornem conhecidos elementos reveladores de uma situação de inelegibilidade já existente, e ainda subsistente, mas não detectada previamente à eleição; após a eleição se inscrevam em partido diverso daquele pelo qual foram apresentados a sufrágio eleitoral; pratiquem ou sejam individualmente responsáveis pela prática dos actos previstos no art. 9.º; no exercício das suas funções, ou por causa delas, intervenham em procedimento administrativo, acto ou contrato de direito público ou privado relativamente ao qual se verifique impedimento legal, visando a obtenção de vantagem patrimonial para si ou para outrem[22]. As causas de perda de mandato fundam-se, como se disse anteriormente, na prática destas ilegalidades graves, que fundamentam a restrição do direito ao acesso e ao exercício de cargos públicos, tendo o mesmo fundamento que o estabelecimento de inelegibilidades à luz do art. 50.º/3 CRP. A urgência desta acção justifica-se pela pela duração limitada dos mandatos. A tutela urgente é assim um meio para atingir um fim: evitar que um cidadão, que tenha sido eleito através do exercício de um direito fundamental, se mantenha no exercício de funções reunindo condições (através da prática de ilegalidades graves) que fundamentam a sua consideração superveniente - id est, em exercício de funções – como cidadão inidóneo para o exercício de um cargo público (tornando-se necessária uma tramitação urgente, no sentido de não permitir que o mandato termine e cesse o seu exercício de funções).
               Do supra exposto retira-se que existe uma materialidade subjacente a ambas as figuras que nos permite aproximá-las: ambas visam a tutela objectiva da legalidade (máxime, a tutela de direitos fundamentais), assegurando um acesso legítimo ao exercício de cargos públicos, de uma banda, e mantendo o exercício legítimo desses mesmos cargos públicos, de outra banda. Pode assim retirar-se uma conclusão: está encontrado o nosso caso análogo em sede de formas de processo urgentes que nos permite integrar a lacuna remissiva supra identificada. A acção de declaração de perda de mandato segue, nos termos expostos, a forma da acção urgente de contencioso eleitoral[23]/[24].

            Por fim, e mesmo que assim não se entenda, note-se, a situação ficará resolvida à luz da nova reforma do contencioso administrativo. Na medida em que não se admita (ou não se queira admitir) a acção urgente de contencioso eleitoral como caso análogo que permite integrar a lacuna remissiva assinalada, deverá entender-se que “não [há] especificação própria quanto à tramitação”, pelo que os processos urgentes previstos em lei especial (caso do RJTAL), seguem os termos da acção administrativa – atente-se que a nova reforma consagrará um sistema unipolar no que respeita às acções administrativas[25] -, com os prazos reduzidos a metade, correndo estes mesmos prazos em período de férias, com dispensa de vistos prévios, sendo ainda os actos de secretaria praticados no próprio dia, à luz daquele que será o novo texto do art. 36.º do CPTA[26].



[1] Doravante, sempre que nos referirmos à Lei 27/96, de 1 de Agosto, utilizaremos, para efeitos de facilidade de exposição, a abreviatura RJTAL.
[2] A legitimidade para intentar este tipo de acção é fundamentalmente atribuída ao Ministério Público, sendo ainda alargada a interessados directos e membros do respectivo órgão. Cfr. a este propósito, Ac. STA de 17/6/2003, proc. n.º 994/03 e Ac. STA de 30/7/2003, proc. n.º 1205/2003.
[3] A leitura do preceito deve ser feita de uma perspectiva actualista. A RJTAL data de 1996, ou seja, é anterior ao CPTA, que data de 2002. Desta forma, o art. 15.º/2 remete para a tramitação dos recursos dos actos administrativos dos órgãos da administração local, ou seja, antes da reforma, para os arts. 24.º e ss. LPTA. A reforma operou uma revogação expressa da LPTA, através do art. 6.º, al. e) da L 15//02, de 12 de Fevereiro que aprovou o CPTA, pelo que a remissão é agora entendida como feita para a tramitação da acção administrativa especial. Sobre a revogação operada, ERNESTO VAZ PEREIRA, Da Perda de Mandato Autárquico, Da Dissolução de Órgão Autárquico. Legislação, notas práticas e jurisprudência, Coimbra, Almedina, 2009, p. 62. Sobre a remissão operada, vide ISABEL CELESTE M. FONSECA, Processo Temporalmente Justo e Urgência, Coimbra Editora, 2009, p. 828.
[4] É este o entendimento da doutrina, ISABEL CELESTE M. FONSECA, Processo, cit., p. 828; ANTÓNIO CÂNDIDO DE OLIVEIRA, Direito da Autarquias Locais, 2.ª edição, Coimbra Editora, 2013, pp. 191 e ss.; LUIS BARROSO BATISTA, A Sanção Pecuniária Compulsória no Contencioso Administrativo Autárquico, Coimbra Editora, 2011, p. 151.
[5] ISABEL CELESTE M. FONSECA, Processo, cit., p. 828.
[6] Sobre a revogação e o sentido da remissão, cfr. o que se disse supra na nota 2.
[7] MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, Manual de Processo Administrativo, Coimbra, Almedina, 2013, p. 407.
[8] Para uma abordagem mais aprofundada, designadamente no sentido de perceber quais as acções que seguem a forma de AAC e AAE, vide MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, Manual, cit., pp. 361 e ss., onde o autor faz referência ao actual 546.º/2 CPC; e ISABEL CELESTE M. FONSECA, Processo, cit, pp. 815 e ss..
[9] Neste sentido, DIOGO FREITAS DO AMARAL/MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, Grandes Linhas da Reforma do Contencioso Administrativo, 3.ª edição, Coimbra, Almedina, 2007, p. 80.
[10] Entendendo haver vantagem neste tipo de classificação, cfr. JOSÉ CASALTA NABAIS, “Justiça administrativa e justiça fiscal”, in A reforma da justiça administrativa, Coimbra, 2005, pp. 282 e 283.
[11] ISABEL CELESTE M. FONSECA, Processo, cit, p. 823.
[12] É esta a posição de vários autores, designadamente, M. AROSO DE ALMEIDA/CARLOS CADILHA, Comentário ao Código do Processo dos Tribunais Administrativos, Coimbra, Almedina, 3.ª edição, 2010, p. 547. Acerca desta matéria, vide, VIEIRA DE ANDRADE, “A protecção dos direitos fundamentais dos particulares na justiça administrativa reformada”, in RLJ, ano 134, 2001, n.º 3929, pp. 229 e ss; CARLA AMADO GOMES, “Pretexto, contexto e texto da intimação para a protecção de direitos, liberdades e garantias”, in Estudos em Homenagem ao Professor Doutor Inocêncio Galvão Telles, vol. V, 2013, pp. 541 e ss..
[13] Neste sentido, e com referências complementares nesta matéria ISABEL CELESTE M. FONSECA, Processo, cit, pp. 824 e 825.
[14] Assim, DIOGO FREITAS DO AMARAL/MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, Grandes Linhas, cit. pp 86, 87 e 94 e ss., onde afirmam que os processos de contencioso eleitoral e pré-contratual seguem o modelo da acção administrativa especial, mas com adaptações, destinadas a torna-los mais céleres, sendo esse o motivo pelo qual se apelidam de impugnações urgentes. Os autores destacam, no entanto, serem estas formas distintas daquelas que o CPTA qualifica como acção administrativa especial. Todavia, a doutrina «arruma» tais processos urgentes segundo o critério das formas de processo principais.
[15] A este propósito, PEDRO GONÇALVES, “Contencioso administrativo pré-contratual”, in CJA, 44, 2004, pp. 3 e ss.; e ISABEL CELESTE M. FONSECA, Processo, cit, pp. 821 e 822.
[16] ISABEL CELESTE M. FONSECA, Processo, cit, p. 822. A este propósito ainda designadamente os Acórdãos TCA-N 17/2/2005, proc. n.º 617/04.4BEPRT e TCA-S 13/1/2005, proc. n.º 394/04.
[17] ISABEL CELESTE M. FONSECA, Processo, cit, p. 821.
[18] VIEIRA DE ANDRADE, A Justiça Administrativa, 13.ª edição, Coimbra, Almedina, 2014, pp. 229 (itálico nosso).
[19] Sobre a matéria de delimitação de competências entre os tribunais administrativos e Tribunal Constitucional relativamente a matérias eleitorais autárquicas, cfr. o Ac. TC n.º 88/94, de 13/5/94, que chega a admitir uma situação de dupla jurisdição, uma vez que nos termos do art. 225.º/2/c) da CRP o TC é chamado a apreciar em última instância da regularidade e a validade dos actos de processo eleitoral. O TC faz ainda esgotar a sua competência no momento da apreciação do apuramento final da votação. Neste sentido também VIEIRA DE ANDRADE, A Justiça, cit., p. 230 (nota 605).
[20] Neste sentido, VIEIRA DE ANDRADE, A Justiça, cit., p. 230.
[21] Expressamente no sentido de que a acção de declaração de perda de mandato segue subsidiariamente os termos da impugnação urgente de contencioso eleitoral e, depois, da acção administrativa especial (ainda que sem fundamentar a sua asserção), ERNESTO VAZ PEREIRA, Da Perda de Mandato, cit., p. 62.
[22] Para um tratamento de cada uma destas situações de forma autónoma, cfr. ANTÓNIO CÂNDIDO DE OLIVEIRA, Direito, cit., 191 e ss..
[23] Caso não se admita esta via de argumentação, é-nos possível ensaiar outras vias de resolução do problema. Nesta medida, verifica-se que o modelo de tramitação urgente tem natureza aberta, por via do disposto no art. 36.º/1 CPTA (alberga, portanto outras modalidades de tramitação processual urgente previstas em legislação especial ou também previstas ou contextualizadas no CPTA, ainda que fora dos títulos IV e V. Assim, em sede de CPTA temos as possibilidade de criação, por parte do juiz de formas urgentes ad hoc, nos termos dos arts. 48.º/4 (para os processos em massa), 121.º (para as providências cautelares, com prenuncia definitiva) e 132.º/7 (para as providências relativas à formação de contratos, também com tutela definitiva). Podemos, assim, ainda que de forma discutível, apelar a um raciocínio analógico com o art. 121.º, na medida em que “atendendo à natureza das questões e à gravidade dos interesses envolvidos”, a pronúncia urgente, que não se compadece com a demora, se torna necessária. A decisão de antecipar o juízo não seria já passível de impugnação, já que a natureza urgente da acção resulta do art. 15.º/1 RJTAL. Trata-se, de todo o modo de um raciocínio falível, já que o mecanismo do art. 121.º pressupõe que a primeira acção (providencia cautelar) seja intentada no sentido de alcançar uma tutela provisória, o que não se verifica em sede de acção de declaração de perda de mandato. A natureza da questão e a gravidade dos interesses em jogo fundamentam, no entanto uma antecipação da pronúncia (articulada com a exigência de urgência presente no art. 15.º/1 RJTAL). Sobre o funcionamento do mecanismo do art. 121.º, MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, Manual, cit., pp. 494 a 496. Caso não se demonstre passível de concordância esta última via (o que bem entendemos), a solução será entender que esta acção não seguirá nenhuma das formas urgentes previstas no CPTA ou em legislação avulsa. Como vimos supra no texto a acção de declaração de perda de mandato também não se identifica com a tramitação da AAE (até porque não se vê qualquer prática de acto administrativo que fundamente a sua impugnação, não há condições para reconduzir esta acção à acção de condenação da administração à prática de acto legalmente devido, nem à acção de impugnação de normas/regulamentos), pelo que a solução passará pela sua identificação com a AAC. Neste sentido, temos que acção segue a tramitação prevista nos arts. 552.º e ss. CPC. Ora, verifica-se que em sede do processo civil, a reforma de 2013 trouxe inovações relativamente aos poderes do juiz em sede de gestão processual. Assim, temos a previsão de uma única forma processual que deve ser objecto de adaptação ou adequação judicial (art. 547.º CPC), sendo que o juiz tem um dever de simplificar e agilizar a prática de actos processuais (arts. 6.º e 590.º CPC). Estas alterações ao nível do reforço dos poderes de gestão processual e do reforço do princípio da economia processual parecem autorizar o juiz a adoptar casuisticamente uma tramitação para cada causa, adaptando-a às finalidades da mesma, funcionando como único limite à potestas do juiz o dever de assegurar a essa tramitação abreviada um processo equitativo. Acerca desta matéria, cfr. ELIZABETH FERNANDEZ, O Código de Processo nos Tribunais Administrativos à luz do novo Código de Processo Civil, in Justiça Administrativa, n.º 102, Novembro/Dezembro de 2013, pp. 3 e 10. Parece, portanto, viável a possibilidade de o juiz adequar a forma de processo, atribuindo-lhe uma tramitação mais rápida sendo este dever reforçado por via do carácter urgente consagrado no art.15.º/1 RJTAL. No sentido de que “a adopção do princípio da adequação formal deve ser feita cum grano salis, evitando que o reforço dos poderes/deveres do julgador resulte, na prática, na substituição das matrizes rígidas da lei actual pela praxis que desconsidera as especificidades dos casos e cria rotinas processuais”, JOSÉ FERREIDA DE ALMEIDA, “Algumas notas sobra a aproximação do processo administrativo ao processo civil”, in Justiça Administrativa,n.º102, Novembro/Dezembro 2013, p. 31.
[24] Para uma exposição clara e sucinta desta tramitação, ERNESTO VAZ PEREIRA, Da Perda de Mandato, cit., pp. 62 e ss.
[25] Em boa verdade, e nos termos formulados por SÉRVULO CORREIA, trata-se de uma unipolaridade atenuada, o que resulta de conotações dualistas do seu regime, já que se mantém o grosso dos preceitos da actual versão do CPTA relativamente aos aspectos específicos de cada uma das modalidades de acções administrativas especiais (ainda que sob a capa de excepções a um regime unitário): a impugnação de actos administrativos, a condenação à prática de acto devido e a impugnação de normas e declaração de ilegalidade por omissão. Também existem diferentes requisitos quanto aos quatro tipos de pedidos, quanto aos actos e formalidades e também quanto às causas de pedir. Estes são apenas alguns dos aspectos destacados por SÉRVULO CORREIA, “Da ação Administrativa especial à nova acção administrativa”, in Justiça Administrativa, n.º 106, Jullho/Agosto 2014, pp. 52 e ss. em especial.
[26] Conforme se pode ler no projecto de reforma do CPTA.


João Serras de Sousa, n.º 22062

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