"O
acto administrativo contra o mundo"
O
confronto histórico entre os modelos de justiça administrativa, o objectivista
e o subjectivista, entre os quais o primeiro visa a defesa da legalidade e o
segundo uma óptica mais individual de tutela de direitos ou de interesses
legalmente protegidos, foi deixando marcas no contencioso administrativo.
Apesar da mudança de paradigma de base objectivista para um sistema
subjectivista, após a reforma do contencioso, há ainda marcas do modelo
objectivista no C.P.T.A, nomeadamente no art.º 55 nº 1 a) do C.P.T.A.
Posição
também defendida pelo Prof. Vieira de Andrade que nos diz que toda esta norma
tem um carácter objectivista pois continua a conferir a legitimidade para
impugnar actos administrativos aos titulares de meros interesses de facto, a
estes interesses de facto faz também menção o Prof. Aroso de Almeida quando diz
que há luz deste “interesse pessoal e directo” pode ser pedida a impugnação de
acto administrativo por quem tenha nisso interesse para si de uma vantagem jurídica
ou económica, a vantagem económica é aqui a alusão aos meros interesses de
facto, ou seja, não necessita o autor de numa destas alegar a titularidade de uma
posição jurídica subjectiva, o que na minha opinião alarga em muito o leque de
pessoas com legitimidade processual para tentar impugnar um acto
administrativo.
Isto
acontece devido ao facto do critério do “interesse pessoal e directo”, que no
mesmo art.º 55 nº 1 a) do C.P.T.A é seguido pela frase “… designadamente por
ter sido lesado pelo acto nos seus direitos ou interesses legalmente protegidos”,
não estar directamente ligado e relevar apenas a primeira parte para a atribuição
da legitimidade activa para impugnação de acto administrativo.
Este
critério do “interesse pessoal e directo” segundo o Prof. Aroso de Almeida
apenas tem como limite o facto de o autor prosseguir para a acção no seu próprio
interesse (pessoal) e de que este lhe possa trazer um benefício imediato, o que
mais uma vez volto a dizer, alarga em muito o leque de pessoas com legitimidade
para impugnar certo acto, dai o título do post ser “O acto administrativo
contra o mundo”.
Passo
agora à minha humilde opinião sobre esta questão da legitimidade alargada!
Que
as pessoas possam defender as suas pretensões em tribunal e fazer valer os seus
direitos perante as afectem e lhes possa trazer uma desvantagem, até este
momento todos concordam, mas essas pretensões ou situações desvantajosas não se
devem prender com meros interesses de facto.
Não
duvidando da competência dos tribunais para decidir sobre o mérito da procedência
ou não dessa mesma acção, mas este critério leva a que possam ser intentadas acções
nos tribunais administrativos que não estejam relacionadas com nenhuma razão jurídica
de fundo que valha a pena ser discutida em tribunal, temos o exemplo do proc.
911/05 de 25 de maio 2006 em que o tribunal reconheceu legitimidade ao
proprietário de um posto de combustível para impugnar o licenciamento da construção
de um novo posto de combustível que poderia comprometer a viabilidade económica
do seu posto de combustíveis, ou o caso do aluno descontente com a atribuição de
uma bolsa a outro aluno em seu detrimento, exemplo dado pelo Dr. José Duarte
Coimbra no seu trabalho de oral de melhoria de contencioso.
Para
evitar exemplos de acções destas que mais me parecem “perdas de tempo”, que
penso que a possibilidade de intentar acções de impugnação de actos por “meros
interesses de facto” devia ser afastada.
Os
tribunais devem discutir situações de direitos ou de interesses legalmente
protegidos que foram violados ou que não estão a ser respeitados, ou ainda
outras acções que tenham razões jurídicas na sua substância e não o facto de
certo acto administrativo poder levar à diminuição do lucro de um posto de combustível
ou de outra actividade.
Além
disso a concepção ampla da relação jurídica administrativa que concebe a relação
jurídica administrativa como não apenas bilateral mas como um conjunto de mais
intervenientes, também por uma posição jurídica subjectiva ampla, como é
defendido pelo Dr. José Duarte Coimbra, tal como está no seu trabalho de oral
de melhoria, é a junção destas teorias que permite interligar o “interesse
pessoal e directo” à posição jurídica subjectiva da sua relação jurídica administrativa
na concepção ampla, que daria legitimidade activa para intentar acções quando o
individuo tivesse a sua posição jurídica lesada ou houvesse ilegalidade do acto
administrativo, afastando assim os meros interesses de facto da equação.
Bibliografia:
Silva,
Vasco Pereira – “O Contencioso no divã da psicanalise”
Almeida,
Mário Aroso de – “ Manual de Processo Administrativo” págs. 233 a 239
Vieira
de Andrade, José Carlos – “Justiça Administrativa” págs. 196 e s.s.
Coimbra,
José Duarte- “Trabalho de oral de Melhoria de Contencioso Administrativo”
Milton
Aurélio
Nº21417
Visto.
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